terça-feira, 30 de maio de 2017

DE TRÉGUAS E LUZ



Tua aparição enlaçou-me num fisgar
de olhos.

Submergi.

Oceanos e mares e rios
nadaram
em mim.

Tréguas!

Não mais tsunamis
(de trevas).

Hoje apalpo inútil arcabuz.

Sou um aquário
de muitas
águas,
onde sobrevoam
águias

vorazes
de
Luz.


(Livro: RAÍZES ACESAS EM SOLO DE NUVENS)

domingo, 28 de maio de 2017

FRAGMENTO I




Sou um barco sem fundo e sem vela.
À deriva.
Uma folha seca levada pelo vento traiçoeiro.
Não uma folha morta. Viva por inteiro!
Um pedaço colorido de sonho infiltrado
nas dobras fibrosas
do firmamento.

Sou um pensamento alado
escondido atrás de nevoeiros densos.
Um diminuto reflexo ausente do alarido
do mundo.
Uma estrela despontando de uma noite escura,
presente no silêncio absoluto de uma aurora
clara e pura.

Sou uma imagem que se vai e que se move
lenta
como um desenho abstrato fixo na tela
para depois retornar no galope moreno
e profundo
de um cavalo cor de canela.

Sou uma janela pequenina – sem trinco
sempre aberta para o distante pôr do sol
de uma aparência afogueada e purpurina
desmaiada no caminho azul
do infinito.

Sou um grito na amplidão
solto e disperso...
ladeado de florezinhas alagadas
em Solidão benfazeja.
Sou o sereno refúgio das andorinhas, a velha torre
de uma igreja cujas paredes são vigorosas redes
entre si próprias presas:
entranhadas numa alegria transfigurante
germinada
na metamorfose súbita
de mim mesma!




DAS HORAS MÍTICAS




Imortalizo bem dentro de mim os sonhos bons,
as míticas alegrias.
E me farto das noites e dos dias
e me interno num largo contentamento.
Não esquece o meu pensamento as horas mágicas
em que me refugio, porque não o afetam
(tão misterioso!), os conscientes desvarios
que me dilatam para além do fim.

Limitar-me é colecionar repetitismos.
E isto é terrivelmente doloroso!
Não mais me limito porque abomino
paisagens repetidas, a mesmíssima  lida.

Se nasci para me reproduzir
em muitas e muitas vidas.


(Livro “DE IMAGENS, PALAVRAS...SILÊNCIOS E OUTRAS LINGUAGENS)

quinta-feira, 25 de maio de 2017

A VOZ DO TEMPO



Hoje é um dia de dança,
de luz,
de sol
E esperança.
Furtar-me ao bom dia de hoje
temerário seria.
Por isso, não vou.

Quero muita vida, sem tardança.
Nas esquinas da dor, driblar o imprestável.
Apenas o presente bastar-me-ia!
Liberdade quero.
Carinhos da paz,
ternura de alianças,
novo itinerário celebrar.
Até mesmo o insonhável,
ousar.

Quero beber o dia de hoje.
Tragar o intragável, tagarelar o silêncio
das horas.
Embriagar-me de promessas esotéricas, buriladas
no sagrado esmeril da fé.
Não quero o amor servil; quero-o
de pé.

Porque ontem agora não passa de uma frágil
pilastra
que a brisa da noite
ruiu.

terça-feira, 23 de maio de 2017

ESPELHOS




Posso nos teus olhos me espelhar
por razões óbvias
ou sem claras razões.

Quase por inteiro me vejo 
na transparência que eles são.
De repente, me sou nos caminhos que eles sabem.
De repente, me vou nas paisagens que eles trazem.
E não volto nunca mais... pelas mesmas estradas.

Se teus olhos espelham a carícia 
(inquebrantável)
dos ventos divinos!
Sem óbvias razões,
sem razões claras.

Se tudo o que os teus olhos reluzem
minha alma decifra 
sem precisão de palavras.

O INVERNO SÃO OS OUTROS




O inverno são
os outros: sem calor
humano, sem poesia
nas mãos, sem um olhar
de parceria
e compaixão.

O inverno são
os outros: sem amor
cotidiano, sem alegria
nos pés, sem um sorriso
de sintonia
e fé.

O inverno são
os outros: que há muito
se congelaram
em abundante egoísmo
e traição.

O inverno são os outros?

[Preciso repensar a ponta do iceberg
que, clandestinamente, foi-se
instalando_ cortante foice_
nos oceanos revoltos
da minha emoção.]

...

O inverno?

São as outras em que me transformei
a cada nova

Desilusão.


APRENDIZAGEM




Ensinaram-me ser os sonhos
resistentes soldados 
aos infectos impactos

da vida.


Fetos e feitos que se vão formando
com argamassa sólida no leito movediço

do chão.


Que mesmo partidos no ventre
do coração


 - são inteiriços elos -


entre a momentânea cegueira

e a duradoura visão.

segunda-feira, 22 de maio de 2017

BORBOLETA AZUL




Borboleta azul pousada
no dorso
do mundo
abre as asas e mergulha
fundo
na tarde aquecida
de sol.


Sorve gotas de vida
no vento liso do assombro
no assomo livre dos ombros voantes.


Seu peso leve se equilibra entre aromas
e circunstâncias.
Sua raiz, seiva de presença e abandono.


E a Borboleta azul − pousada
na tarde esquecida
de sol −
abre os olhos lacrimejantes


de Outono.

ÉGUAS MARINHAS



Venho de muitas remotas águas.
Éguas marinhas -  cor de fogo -
entrelaçam meu esquivo  olhar,
laçam meio sopro
de vida
no mar que me circunda.


Oriunda de outros plágios,
adágios submergem
meus olhos
em luzes noturnas
de não me esquecer.


Venho de muitas conflitantes águas
ágoras de me redimir - Agora -
na morte andarilha
que desde aquele sempre
me quis. 

(marli carvalho da silva)
....

LUA ANCESTRAL




Lua de fogo ancestral
(tens
a Idade da Pedra).
Cintilas
xamãs
rituais de cura
quimeras.


Lua – de fogo –
(cavalo rebelde de ruidosas crinas)
tua mistura de silêncio
e hipnose
- a overdose da minha sagrada
Escritura.


Lua tribal, o fogo de ouro
atrelado
ao brilho prata de teu rosto
[ caça ]
− ao infatigável ritmo de Diana −
animais ferozes fustigados
pelo tempo-aroma-de luzes-e-trevas:





a imagem decadente 
que ronda
a mente humana moderna.

(marli carvalho da silva)