domingo, 28 de maio de 2017

FRAGMENTO I




Sou um barco sem fundo e sem vela.
À deriva.
Uma folha seca levada pelo vento traiçoeiro.
Não uma folha morta. Viva por inteiro!
Um pedaço colorido de sonho infiltrado
nas dobras fibrosas
do firmamento.

Sou um pensamento alado
escondido atrás de nevoeiros densos.
Um diminuto reflexo ausente do alarido
do mundo.
Uma estrela despontando de uma noite escura,
presente no silêncio absoluto de uma aurora
clara e pura.

Sou uma imagem que se vai e que se move
lenta
como um desenho abstrato fixo na tela
para depois retornar no galope moreno
e profundo
de um cavalo cor de canela.

Sou uma janela pequenina – sem trinco
sempre aberta para o distante pôr do sol
de uma aparência afogueada e purpurina
desmaiada no caminho azul
do infinito.

Sou um grito na amplidão
solto e disperso...
ladeado de florezinhas alagadas
em Solidão benfazeja.
Sou o sereno refúgio das andorinhas, a velha torre
de uma igreja cujas paredes são vigorosas redes
entre si próprias presas:
entranhadas numa alegria transfigurante
germinada
na metamorfose súbita
de mim mesma!




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